Naquele ano de
Há dias, festejou-se com pompa e circunstância, o centenário da sua fundação e o Baságueda aqui presta a sua homenagem a tão insigne Instituição: A União de Aldeia de João Pires, Sociedade Recreativa e Musical, de seu nome completo e oficial. A pompa e a circunstância incluíu a publicação do Livro “Banda Filarmónica de Aldeia de João Pires – Centenário”, da autoria de Lopes Marcelo, que reúne muitas das muitas histórias que cabem num século de história.
Contam-se duas, a primeira, protagonizada pelo primitivo impulsionador da Banda, o Pe José Maria, e recordada no dito Livro, remete para o episódio da efémera restauração da Monarquia em Aldeia de João Pires, em 1912; a segunda, referencia um outro grande homem da Banda: o Sargento “Jaimeca”.
1. Com a devida vénia, transcreve-se um pequeno extracto do texto de Lopes Marcelo:
“Na sequência da implantação da República em 1910, seguiu-se um período de agitação em que a perseguição às Ordens Religiosas e à Igreja Católica foi muito forte, com a alteração das funções dos Párocos resultante da Lei do Registo de Afonso Costa em 1911. Acresce que o Padre José Maria era um fervoroso adepto da monarquia e, em 1912, perante a notícia de que o movimento chefiado por Paiva Couceiro tinha restaurado a Monarquia no Norte, não se conteve e proclamou restaurada a Monarquia em Aldeia de João Pires em clima de festa e com foguetes. Quando a notícia chegou à guarnição militar aquartelada em Penamacor, logo a tropa saiu para repôr a ordem republicana…”
A história continua com a fuga do Pe José Maria, primeiro para Monsanto, com contornos rocambulescos, depois para a Espanha e daí para o Brasil. Anos mais tarde, em 1926, haveria de retomar as suas funções de Pároco de Aldeia de João Pires (e Aldeia do Bispo).
Fugas à parte, realça-se o episódio interessante da restauração da Monarquia pelo Pe José Maria, donde, comparativamente à grande maioria do resto do vastíssimo território português - nesta época incluíam-se as províncias ultramarinas -, Aldeia de João Pires tem mais tempo de Monarquia, ou, se se preferir, tem menos tempo de República.
2. Jaime Antunes Rei, mundialmente conhecido por Jaimeca, atingiu o posto de 1º Sargento do Exército Português, tendo dedicado parte da sua vida à Banda de Aldeia de João Pires, sobretudo a partir da aposentação em 1963, quando se fixou na sua aldeia natal. Localmente, também se referiam a ele como "sargento porqueiro" por via da criação de suínos que mantinha ali nas imediações da aldeia. O Changoto já nos fez antever, no post anterior, quão especialista ele era na arte de criar recos, a pontos de até ter pretendido registar a patente de uma nova raça: a ALJARPI. Os animais andavam soltos na sua propriedade, alimentando-se de tudo o que podiam encontrar, fossem bolotas ou criadilhas, preocupando-se Jaimeca, todavia, em lhes fornecer o complemento nas medidas que só ele sabia determinar, com as farinhas que ia comprar a Aldeia do Bispo, ao estabelecimento comercial dos progenitores destes dois que vos entretêm no Baságueda. Igualmente não prescindia da clássica vianda, composta de restos de comida e legumes vários, muita botelha, batata miúda, couves, tomate, enfim, todo o excedente da horta.
Antes de ter investido numa mobilette, seguramente por influência de algum emigrante em França, daquelas que possuíam pedais só para a pôr a trabalhar e depois andava sem mudanças, o seu meio de transporte por excelência era a bicicleta, quer para se deslocar a Aldeia do Bispo à farinha, quer para abastecer a pia dos seus tós. Cena característica era a do Jaimeca a transportar vários caldeiros de vianda enfiados pela asa numa vara assente no guiador da bicicleta, mais uma saca de ração no suporte traseiro. Um equilibrista, o Jaimeca. E sempre, mas sempre, com uma mola de roupa a apertar a parte exterior das calças, junto ao tornozelo, por via de não as sujar com a massa da corrente da bicicleta.
Numa das centenas de vezes que lhe vendi uma saca de 50 Kg de ração para porcos em crescimento, que ele acondicionou cuidadosamente no suporte traseiro, já ele tinha percorrido 100 metros estrada acima a caminho da sua Aldeia de João Pires, quando, ali junto à casa do Ti Julho Aspirante, lhe aconteceu um raro percalço que até o fez tombar. A cena resume-se em dois parágrafos:
Vinha a descer o T'Zé Branco, de aguilhão empinado assente no ombro, à frente da sua Junta mista composta pela vaca andorinha e da burranca freira maria, assim chamada por causa da lista branca na testa a contrastar com o escuro do resto do pêlo. A sair do quintal, vinha o jerico pardal do Aspirante que de imediato cheirou o cio da freira maria. O instinto animal do pardal não quis saber dos berros do Aspirante nem do aguilhão do Branco e vai de atirar as patas dianteiras para cima da asinina fêmea, firmemente determinado a doar-lhe a sua contribuição para a reprodução da espécie.
O rebuliço apanhou o nosso Jaimeca em cima da bicicleta, em equilibrio periclitante, não tendo conseguido evitar o estatelanço no alcatrão. Não ficou muito magoado o maestro músico, mas a saca da ração rachou ao meio espalhando a farinha para porcos em crescimento a toda a largura da via, mesmo à frente da vaca andorinha. Esta não se fez rogada a aproveitar a oferta, manjar raro para as sua beiças. Foram precisos algumas aguilhadas no costolado dos quadrúpedes, evidentemente acompanhados por vocabulário impróprio, mesmo para eles, por parte do T'Zé Branco, para repôr a ordem e a lei. Ajudei o Jaimeca a apanhar a farinha para uma nova saca e ele lá seguiu em direcção à aldeia dos cucos.
Aqui ficam expressos e registados os votos de longa vida à Banda Filarmónica de Aldeia de João Pires.
2 comentários:
Já li e gostei. Parabéns à Banda e ao movimento associativo cultural local.
P. salvado
Embora já seja Cuco velho, não posso deixar de cucurejar, alegremente, o meu encantamento e o meu agradecimento por este belo texto dedicado à nossa Aldeia e à nossa Banda. Também lá estive. Que grande festa!!!
Enviar um comentário