segunda-feira, fevereiro 15, 2016

A NOSSA FALADURA - CCXLI - ARTIMPENCHA / ARTEMPENCHA



A faladura do povo sempre me surpreendeu. É essa a razão de ser do próprio basa.Foram muitas as circunstâncias que me despertaram para esta temática. Sirva de exemplo o significante ' dembanão'. Foi por acaso que, um dia, a ti Tecla, carregada com o cesto que trazia da sorte da ribeira à cabeça, em conversa com a ti Conceição Pires, mulher das portelas sempre cheia de que fazer ... com a ti Tecla, porém, todas as pressas davam em vagares porque ela nunca tinha pressa, mesmo carregada com o cesto, tarefa, a bem dizer diária. Entre a sorte da ribeira e a casa, no cimo de aldeia, perto das escolas novas, o intervalo de tempo rondaria as duas horas, tudo para cima. Dizia eu, então, que foi com ela que naquele dia me deixou clara a evolução até ao dembanão e até ao dabanão. Ora vejamos: Tecla dizia que 'indembanão' uma pessoa estava viva e, logo, estava morta. Apurei o som e li: afinal, aquilo que me parece ser dabanão, mais não é que a aglutinação  de AINDA BEM NÃO.Daqui derivou para indembanão, depressa para dembanão e de caminho para dabanão. O que se passa é que eu pensava que o povo dizia dabanão com o sentido de repentinamente, quando, afinal, a raíz dessa semântica era anterior: vinha mesmo de Ainda bem não. Tudo claro, tudo justificado
Foi também por acaso que fui despertado para este artimpencha. Rosa Espeta Figos, de telemóvel na mão, a querer ligar para a filha, cujo nome não encontrava na listagem nominal constante no aparelho, sai-se com esta: "rais parta esta artimpencha que num intendo nada distoNum incontro aqui o nome da mnha Celestre. Intigamente a gente ia ali à rosa, levava o númaro num papel e a chamada lá ia a ter. Agora com esta artimpencha, fica uma pessoa baralhada". Fui ter com ela e lá lhe liguei para a Celestre.
Pus-me, depois, a analisar  donde raio teria vindo este ARTIMPENCHA.E concluí: artimpencha só pode ser resultado de ARTE(facto) + EMPECILHO. Isto é: temos na mão um aparelho (artefacto) que em vez de facilitar o que nos propomos, só atrasa o nosso desiderato...logo, é um e(i)mpecilho. A nasalação é facílima de explicar e não é o basa que se vai entreter com aulas de fonética científica.
Serve este prefácio para vos deixar um texto que me vi na contingência de escrever porque também este tema me preocupava. Porque é que as igrejas clássicas, desde as prémedievais tinham aquela configuração e aquela simbologia. Claro que falo da simbologia cristã, já que as outras não são do meu conhecimento suficiente e não quero cometer abusos interpretativos sem fundamento. Então aqui fica esse texto e espero que não mais, ao entrardes numa igreja tradicional fiqueis estupefactos e não entendais o que tudo o que vos envolve significa. A intenção é ajudar... Se algum termo vos ultrapassa, só há que ir ao dicionário que estava na prateleira com bastante pó, devido a tanto tempo de descanso.

Aqui vai então:

Há quem diga que a história do cristianismo é a história mais bem contada de todos os tempos.

A figura de Cristo é um marco indelével na civilização, tanto mais que a própria história e o calendário se refere ao seu nascimento e se fala em dois grandes períodos : a. C. e d.C.

As Igrejas, locais sagrados por excelência, nem sempre existiram. A princípio os cristãos reuniam-se em catacumbas e em casas de grandes senhores onde se reuniam e debatiam a palavra divina.

As Igrejas não são exclusivamente lugares de culto; foram durante muito tempo casas de abrigo. Até mesmo foragidos, enquanto estivessem sob o tecto das igrejas, estavam protegidos e não podiam ser presos.

Repare-se ainda que a Igreja é um referencial de importância incalculável, durante muitos séculos: ficava situada no centro das povoações, o casario começava a construir-se à sua volta, e a torre sineira, indicava as horas, tocava  as Ave-Marias e marcava a todos os ritmos de vida.

Habilmente o cristianismo aproveitou-se das festividades pagãs em honra da natureza e transformou-as em datas sagradas. O calendário litúrgico é determinante sob muitos pontos de vista.

A ornamentação e a própria arquitectura das igrejas não são obras do acaso ou fruto da criatividade dos artistas. Obedecem a determinadas regras e acarretam consigo uma simbologia que convém deslindar para que quando entremos num templo saibamos ler o que está por detrás do que se vê.

É por demais consabido que as religiões vivem de mistérios, de dogmas, de preceitos, têm por base um livro sacro,  são representadas por pontífices, sacerdotes, monges, adivinhos, videntes, magos, até bruxos,…

Sendo o cristianismo uma religião da Revelação, é muito pouco o que está revelado. Por isso há os teólogos que esclarecem o que deve ser entendido, por detrás do que está escrito, ou vem da tradição oral. Interpretações outras que divirjam da oficial caem, inevitavelmente, no anátema, no apóstata, no iconoclasta, no herege, no protestante, no excomungado, no condenado…

A Igreja, no seu todo e cada uma em particular, representa o corpo místico de Deus, as pedras da construção são os fiéis que a suportam, alimentam e garantem a sua robustez e segurança.

As janelas significam a abertura ao exterior, nos vitrais representam-se figuras eméritas ou cenas bíblicas, o pavimento é o fundamento da fé e as colunas e vigas são representações dos grandes alicerces da doutrina da Fé.

Impõem-se algumas questões, que visam esclarecer o fiel que entra num templo e ignora o significado de cada um dos elementos que fazem parte da estrutura de uma eclésia.

Qual a orientação geral que deve ter uma igreja? Porquê?
Que representam a pedra do altar e a toalha branca que a cobre?
Qual a forma da pia baptismal?
A que se referem o fogo e o incenso?

Que motivos se encontram nas portas de entrada, nas jambas, nas arquivoltas, nos tímpanos?
Quais as três funções principais do sino?
Qual a colocação correcta do vitral?

Convém desde já estabelecer uma diferença entre o que é arte religiosa e arte sacra ou sagrada, já que são dois campos distintos.

Arte religiosa tem a ver com o artista e a sua liberdade criativa. Tanto pode fazer uma obra de arte religiosa como profana. Depende da sua inspiração executa-a em plena liberdade.
A arte sacra por sua vez não é de natureza sentimental, mas antes de ordem metafísica e cosmológica. Aqui o artista tem pouca margem para a sua liberdade criativa.

A arte sacra propõe-se tornar visível o invisível de forma tal que a divindade se torne acessível a qualquer crente.
Um templo não serve apenas para reunir os crentes mas também criar um ambiente de recolhimento e de comunhão de ideais que permitam uma relação mais próxima com o divino.

Deve notar-se que cada vez mais se verifica uma cada vez menor criatividade sacra. O mundo contemporâneo é cada vez mais materialista.

Só nos finais do  sec. III e princípios do sec. IV durante o império de Valério Diocleciano (284-305) os cristãos adoptaram a prática de adorarem deus em templos. Foi assim que surgiu o rito da missa (de Messiah, o Messias, o ungido).

O ritual da missa era, ao princípio, muito simples: consistia numa refeição – a ágape - e de leitura de escritos sagrados. Durante a ÁGAPE repartia-se o pão, rezava-se a oração de graças, repartia-se o pão e partilhava-se o vinho. Aos poucos a ágape desapareceu devido aos excessos.

De notar ainda que os primeiros cristãos não tinham manifestações públicas, tais como procissões, peregrinações ou cerimónias equivalentes.
Significativo é o facto de tanto a hierarquia como os fiéis não utilizarem vestes distintivas.

A doutrina de Cristo impunha serviço e não patronato. Assim, os discípulos das comunidades cristãs deviam estar disponíveis para servir e não para impor.

Ninitius Félix (convertido do sec. II d.C. ) afirmava. « Imaginais que nós, cristãos, escondemos aquele que adoramos porque não possuímos templos ou altares?
Que templo poderia ser erigido a deus se o universo é a sua maior obra. Como fechar o omnipotente dentro de um edifício? Não é melhor consagrarmos um templo à divindade em nosso coração e nosso espírito?»

Após a morte de Cristo começaram a formar-se pequenas comunidades que iam, elas próprias interpretando as escrituras. Aos poucos começou a ver-se que havia diferenças significativas. Por isso, uma vez que “todos os caminhos vão dar a Roma” estabeleceu-se que a doutrina oficial o cristianismo seria a ditada pela congregação de Roma.

Como já acima se referiu só a partir do sec. III se começaram a construir templos e não deixa de ser curiosa a determinação do papa Gregório Magno, já nos fins do sec VI:«podeis destruir os ídolos mas nunca os templos. Borrifai-os com água benta colocai as nossas relíquias e deixai que o povo continue  a prestar culto nos locais onde sempre o prestou».

O Cristianismo, de início, não tinha símbolos e vai enraizá-los em duas proveniências: as religiões cósmicas e na cultura hebraica.


O templo primitivo  era um templo natural que aproveitava colinas, grutas, árvores, pedras, nascentes,… Pode até fazer-se uma comparação entre esses templos e os actuais:

Templo primitivo (paisagem natural)
Templo cristão (paisagem petrificada)

Colina ou montanha sagrada

Gruta

Árvores ou pedras verticais

Pedra sagrada

Nascente

Fogos e fumos

Cerca

Céu

Colunas solares

Percussão em metal

Degraus do altar

Nichos ou ábsides

Colunas interiores

Altar

Pia baptismal

Candelabros e incenso

Edifício

Abóbada

Torres

Toque de sino


A orientação geral dos templos foi, inicialmente, com a porta de entrada virada a oeste e o altar mor para leste ( o nascer do sol), arquitectura que se perdeu quase por completo, devido a uma multiplicidade de factores.

Em sentido lato a igreja é o povo de deus. Em Niceia o credo definiu que a igreja seria una, santa, católica, apostólica, romana.
Depois da divisão do império romano por Diocleciano em 285, designa-se por igreja do Ocidente, ou Latina (porque a língua adoptada foi essa) os que dependiam de Roma e do papa e por Igreja Bizantina os que obedeciam à igreja de Constantinopla e seu patriarca.
A ruptura entre as duas igrejas deu-se oficialmente em 1054.

Existem outras nomenclaturas : igreja celeste ou triunfante e a terrestre, igreja visível e invisível. A mesma palavra serve para designar  a assembleia de cristãos e o edifício onde se reúnem os fiéis.

Principais partes de uma igreja:

Porta de entrada – uma das partes mais importantes do edifício pela simbologia que lhe é atribuída: passagem de um espaço profano para um espaço sagrado.

Ábside – Parte semicircular oposta à porta de entrada.

Absidíola- capela lateral que abre para o deambulatório.

Cabeceira – parte exterior da abside, em regra virada para leste.

Coro -  parte mais próxima do altar mor, acessível apenas a clérigos e raramente a crianças separado por um gradeamento -a coxia- limite a que os fiéis podiam chegar.

Cripta - Parte baixa destinada a receber a relíquia de um santo ou um corpo.

Nártex - preâmbulo da entrada antes do cata-vento e destinada aos catecúmenos.

Nave – parte reservada aos fiéis entre a entrada e a capela mor.

Transepto – Extensão ou corpo transversal que separa o corpo da igreja da capela mor e que torna a  planta da igreja cruciforme.

Zimbório - parte alta na vertical do centro do transepto e que significava o alto onde morava o Senhor. É para o alto que viramos o olhar quando oramos.

Há que notar que as igrejas eram espaços respeitados:”Não invadirei uma igreja de nenhuma maneira em virtude da salvaguarda que a protege. Também não invadirei os celeiros que estão no recinto da igreja. Não atacarei o clérigo ou o monge; não levarei boi ou burro, vaca, porco, ovelha ou carneiro, nem o molho de lenha, nem a égua e seu potro. Não apreenderei camponês, camponesa ou mercador. Não lhes tomarei o dinheiro nem os forçarei a resgate….”

A construção de um templo começa pela definição exacta do local onde ficará o altar encarado como o centro do mundo. Depois vem a orientação.
Em todas as igrejas as formas geométricas são a bem dizer o quadrado e o círculo. O círculo ou as suas divisões representam o céu e por isso se sobrepõe o quadrado/cubo.

A porta é por excelência, juntamente com o altar um dos locais onde a simbologia mais se representa. Normalmente as grandes igrejas oferecem-nos na porta os seguintes elementos:

TÍMPANO – a parte mais importante, grande parte das vezes preenchido com o Cristo em glória, sentado no trono com uma mão levantada e a outra segurando o Livro da  vida e ladeado pelos tetramorfo: homem,touro,águia e leão.
Pode ter também representado o Juízo Final, a Virgem Maria,ou a transfiguração de Cristo.

ARQUIVOLTAS – Por cima do tímpano, em regra representando a hierarquia celeste.

JAMBAS – colunas verticais ao lado da entrada representando profetas, reis bíblicos, santos,..

MAINEL – parte do fechamento das duas folhas da porta onde é vulgar encontrar-se o monograma de Cristo: o X e o P. ( De notar que estas letras são do alfabeto grego e  a primeira é o QUI e a segunda é o RÓ , ou seja XP é equivalente a CR, que mais não são no léxico latino as primeiras letras do nome CRisto).
O cimo das portas era normalmente semicircular aparentando ser o Arco do Triunfo, símbolo da vitória do Bem sobre o Mal.

Outros símbolos:

A TORRE e o CAMPANÁRIO – indicando o céu e convidando à oração, marcando o ritmo de vida dos fiéis ao som do sino, que simbolizava também o afastamento do mal. Por vezes as torres são encimadas por um GALO que faz lembrar a traição de Pedro. Além disso, o Galo é o despertador da manhã rompendo portanto com as trevas e anunciando a luz do novo dia. Santo Ambrósio apelida mesmo Cristo de GALLUS MYSTICUS.

PIA DA ÁGUA BENTA – ao entrar convém a purificação pela água.

BATISTÉRIO / PIA BATISMAL - símbolo da ruptura com Satanás e admissão no corpo da eclésia, recordando as nascentes de água pura. Muitas vezes de forma octogonal simbolizando a passagem do mundo terreno ao celeste.

ALTAR- mesa de pedra ou madeira, normalmente esculpida, onde antigamente os sacerdotes imolavam as vítimas e ofereciam incenso e agora se celebra a missa.
A toalha branca que o cobre mais não é que a mortalha de Cristo.
O altar é o coração da igreja por isso local central por eminência.
É também o local onde se reparte o pão e recorda o sonho de Jacob.

FOGO E INCENSO- como elementos regeneradores e purificadores.

A LUZ E OS VITRAIS – Os vitrais eram uma forma de explicar cenas bíblicas a quem não sabia ler.

Labirintos e cruz -  os espíritos malignos entrariam no labirinto e de lá não saíam.
Simboliza também o nascimento – a entrada - e a morte – a saída-.

 A cruz é o distintivo dos cristãos e só no sec XV aparece Cristo na cruz.

Já estou como a Rosa Espeta Figos.Só espero que isto vos tenha servido para lerdes melhor o que vos surge na frente quando entrardes numa igreja. 


XXXXXXXXXXXIIIIIIIIIIGGGGGGGRRRRAAAAAAAAAAAAANNNNNDDDDDDDEEEEEEEE



Desenhos: Carlos Matos