sexta-feira, agosto 26, 2005

A NOSSA FALA - XXII - GOZMIA

Bardina por excelência, Varinha de Arado chegava mesmo a alugar a bicicleta com um furo, à canalha. Aos domingos, depois de missa - ele era sacristão - aí aparecia ele, montado na sua vermelha marca BEATLES, apoiava o pedal sem apoio, suspenso do crenco e com a roda pedaleira sem dois dentes que fazia com que , sobretudo a subir, se tivesse que apanhar o jeito para que a força dispendida não fosse por água abaixo. Marrafinha sempre composta, com BRYLCREAM, à moda do Elvis, sapatinho de verniz, em bico, tipo mata barata ao canto da sala, como aqueles que agora se usam, Varinha, calça sempre bem vincada - era ele mesmo que as passava com o ferro largo, preto com um galo encarnado na ponta e que servia de abertura onde o carvão de azinho cuspia espanhóis e respectivas fonas enquanto esbrazeava o ferro fundido, dando-lhe uma têmpera dum filho da puta - Varinha naquela postura de tiralinhas, mandava hóstias. Botava-se para o polido do ferro um salpico de água e não evaporava, vaporizava-se, mais ainda, sublimava. Era sempre preciso pôr uma entretela das grossas entre o ferro e a peça a passar senão deixava em fanicos ou com um lustro que mais parecia o cabelo de lagareiro por alturas do natal: até alumiava!. Quando não havia água à mão uma cuspidela indicava o quentor do ferro. Chegámos, eu e ele, às escondidas, a fazer uma espécie de tostas mistas com pão ázimo, queijo de cabra e fiambre que o chquim bota-abaixo nos trazia da tasca do ti manel seguro, aquela mesma onde o Cunhal comeu e bebeu uns copos: aquilo bastava pôr uma lata IC limpinha que eu tinha cravado ao velho aranhiço por cima do resto das hóstias com o queijo e o fiambre alternados e em quantidade bastante para justificar o copázio de branco que íamos aproveitando das sobras da missa - aquilo é que era um branquinho !-, bastava, dizia, pôr a latinha por baixo do ferro quando ele estava no ponto, pressionávamos um bocadinho dum lado e depois do outro e, com filha da puta - não havia e acho que nunca mais haverá, tostas mistas daquela qualidade. Sobretudo na altura da desobriga, por voltas de Páscoa, velhos e velhas tudo se ia a confessar, os padres eram mais que muitos, tocava-se o sino, a igreja enchia e era um fartote de fazer hóstias naquela máquina antiga manual que parecia em coffret. Tirávamos aí obra de dez hóstias de cada pão, doze se aproveitássemos bem as curvas... mas quando queríamos fazer as tostas, aí, tirávamos só oito. Éramos artistas...
Um dia contei a história ao Verniz ferro velho e o gázio queria mama. « Tu queres é gozmia», disse eu e fui dizer ao Varinha. "Se o Verniz palmar cinco litros e uma galinha deixamos-lhe provar as nossas tostas» disse o Varinha. E eu fui direito ao Verniz: ' Ó ferro velho, se queres provar o branquinho de missa e mais as tostas de queijo e fiambre, palmas cinco litros de tinto ao velho e uma galinha pedrês à velha' . E o Verniz:« Vós quereis é gozmia!» Vou-vos mas é acusar ao padre e vandens a ver o que é o bom e o bonito»! O Varinha estava a chegar e ouviu: «Ó meu cabrão, se contas alguma coisa a alguém vou já eu a dizer ao teu pai onde é que tu escondeste as alpergatas e as meias mais os rebuçados de leite que lhe sacaste do carrêgo». Aí o Verniz ficou branco! «Pronto, está bem»; «lá os cinco litros eu arranjo mas a galinha pedrês não pode ser». E o Varinha: "trazes dez litros da pipa grande - eu arranjo-te os garrafões - e papas duas tostas das de oito hóstias" . O Verniz, perante tal troco, estende a mão ao Varinha e: "Combinado" É já amanhã! " . E foi. Espetamos uma bezana ao Verniz que tive que lhe meter azeite pela boca e vomitou as escadas todas ao Césaro. Mal saboreou as tostas, coitado!.
Varinha, entretanto, tinha outras habilidades: como já vos disse, encostava o pedal sem apoio suspenso do crenco da vermelha marca BEATLES ali ao pé do café da Rosa a dar vistas para o adro e a canalha que, aos Domingos depois de missa, ia a pedir a benção ao padrinho, à madrinha ou ao avô ou avó,..., os velhos punham a mão sobre a cabeça dos garotos:"Nosso senhor tabendçue (= te abençoe), meu filho! " e , invariavelmente , abriam o porta moedas e lá saíam dois tostões, raramente uma coroa, e a canalha já estava a lamber-se com os bolsos cheios de amendoins da tasca do chico ou com o cartucho de tremoços da rancheira embrulhados em papel de lista telefónica de Lisboa! Só que... Depois de almoço o adro enchia aos Domingos! Qual costil armado a taralhão esfomeado com agúdia cavalal a reluzir aos primeiros raios de sol nos finais de Agosto, Varinha ali estava com a vermelhinha encostada ao passeio do café da Rosa a dar vistas para o adro: os garotos arranhavam-se: ou uma volta na BEATLES ou um cartucho de tremoço da rancheira. O trato era sempre o mesmo: ir ao alto da estrada e voltar por uma coroa. Aquele que ao fim demorasse menos tempo tinha direito à coroa devolvida. Todos os Domingos havia espapada: os que perdiam asseveravam a pés juntos que o ganhador não tinha chegado ao cimo do alto da estrada. Varinha não perdia a calma: «Pronto! vamos todos até ao alto. Eu fico lá e aqui o lobo cerval - Era EU - fica aqui a ver quem dá a volta ao adro e regressa ao alto da estrada.» E lá iam, Varinha, de bicicleta, pois claro, acusadores e acusado, todos, até ao alto. Eu ficava ali. Não tardava aí vinha o ganhador sempre a tocar a campainha e a berrar que os velhos estavam sempre no meio da estrada, dava a volta ao adro e aí ia ele outra vez até ao alto. Varinha tinha um cronómetro: com uma cunca de telha escrevia-se o tempo e o nome no alcatrão. Decidia-se o vencedor mas a coroa nunca regressava:« Então, e quem é que emprestou a bicicleta para o tira teimas?», perguntava o Varinha, e continuava: « se queres a coroa de volta pede-a ao trafulha» Mais espapada. Eram giras as tardes de Domingo!
Duma vez Varinha caçou-me uma fotografia da gaja que eu mais admirava:"se a queres de volta dás-me cinco coroas". E eu: « Não querias mais nada: tu queres è gozmia». "É contigo, quando a quiseres sabes onde está. Trazes as cinco coroas e levas a foto e dás duas voltas na bicicleta". O preço não baixou mas a contrapartida era atractiva. Lá consegui bifar as cinco coroas, passei-as para a mão do rói vides, Varinha passa a fotogafia para a outra mão do rói vides e pronto: foto para mim, cinco coroas para o Varinha e a bicicleta ao dispor. Dei a volta grande: aldeia de joão pires , aranhas, cruzamento das taliscas e aldeia. Varinha estava danado. "Já cá não tornas a pôr o cu". E eu: «Querias gozmia, não?»

23 comentários:

CanisLupusSignatus disse...

Mais uma no aidro! As gerações passam e a "ágora" permanece! Será sempre local de eleição: lugar central, perto da máquina da Ti Rosa e do não menos importante e imponente local de culto - a nossa Igreja Matriz!
Nunca permanece só, seja Verão ou Inverno; habitado por uns durante o dia e frequentado por outros à noite, se todas as pedrinhas de calçada portuguesa lá presentes pudessem falar, não chegariam para contar todas as histórias e historietas por lá vividas... Aliás a calçada é demasiado recente para se poder lembrar de muitas histórias do aidro!
Dá-lhe Changoto!!! Afinfa-lhe Karraio! Vós, entre Outros, é que sabendens!!!

Anónimo disse...

Peço imensa, porra, muita desculpa, mas eu é que fui o visitante 3000, deste Blog. O livro do tio patinhas com o patacôncio, mais aquela estória com o SuperPato é cá do je, fui eu que ganhei!

Anónimo disse...

Tu queres é gozmia, ó pratitamem.

Anónimo disse...

historias de outros tempos que nos fazem ter saudades do futuro, talves hoje nao seja bom dia para
qualquer comentario....é segunda feira...sao terriveis...mas é bom ter raizes....

Anónimo disse...

Ó "MAROUVA", deixa-te de "lamujiches", que o dia ainda está a começar, ainda há muito que fazer, vamos lá a trabalhar! Mai nada!...
Sejas bem regressado "CHANGOTO", há que trabalhar, há que que escrever hitórias, mais uma à maneira; já agora "KARRAIO", já é tempo de acabarem as férias, fico à espera.
Ó pessoal o "CHANGOTO" já voltou.

Anónimo disse...

O meu irmão mais velho tem 52, já lhe falei no blog, pareceu intressado! eu disse interessado ele não gostou, digo eu, tinha muito pra contar que eu nunca ouvi, ainda antes do Salgueiro Maia, esse ainda conheci. Apresentou-me a Bula no dia em que entrei. éra o gajo com menos poder lá no sitio, eu já o conhecia por via do meu irmão no dia 25. Não sabia que 15 anos depois o mundo ia mudar assim tanto. Ele o TC "felizmente", não "mudou", morreu em 92, paz á sua alma já não há pessoas assim. E depois fazem conjuturas estruturantes... nada é feito em nome de Portugal. Pois hoje tou muito nacionalista que pecado grave? ele não é assim!

Anónimo disse...

Esse meu irmão, quando lhe disse que uma vez á muito muito tempo fiquei com a impressão, de que um com. foi banido? quase que me bateu, e eu não pude responder, talves por isso ele ainda não tenha dito nada, mas o Mundo tem mais trinta anos, e tu mais só umas boas dezenas. Agora já não me metes dentro do forno, que eu já não acredito, mas devo á tua nòia post 25, conhecer o homem do inferno, disso nunca me vou esquecer Obrigado.

Anónimo disse...

Acho que é tempo, depois de 3000...pra o blog ser mais interativo, já com o acordo, ou seja é tempo de os autores, tambem serem actores, é julgo chegada a hora, de todos podermos conversar em familia agora que todos nos conhecemos bem, digo eu pelo menos, o blog passava a ser, um verdadeiro encontro de ideias, e não um verdadeiro ponto de conversa sobre algumas propostas. Os autores, são o melhor que já li até hoje, mas são autores vivem o blog da forma, que eu julgo que se deve viver um blog, falo como pratitamem, não fiquem do lado de lá dos post. venham muitas e muitas vezes ao lado de cá com o vosso nome, Changoto e Karraio, este não é um blog de politica é um blog de amigos, vá lá voces fazem muita falta, não só, mas tambem no meio de nós, no meu caso fazeis-me mais falta do que o Word. Acho que muita gente sente o mesmo. Juro aqui solenemente que se for o caso, me dedico de corpo e alma á ortografia.

Anónimo disse...

Lembro-me de um desabafo, dito assim pro longe, misturado no meio da musica, no dia da Festa, mas a olhar pro Lapaxeiro, " Era giro e é um bocado a ideia, tornar isto num Forum" fico á espera Karraio!

Anónimo disse...

onde éque andais, ó resto da cambada, estai de vacances, estais a falhar, onde quer que andais mostrans o sandes...

Anónimo disse...

Estou em crer (e assim espero que seja), que o mês de Setembro há-de trazer muitos e bons textos e comentadores à altura. Oxalá!

Anónimo disse...

Nunca digas desta agua não beberei, tão certo como eu me chamar pratitamem. Sou obrigado a concordar com o anonymous. Não queria mas, tenho uma Esperança enorme, e as minhas vizinhas são todas "piquininas", e Marias.
P.S espero que a preposição cristã, não colida com a hebraica ou a muculmana, todos preocupados e eu, sem saber os acentos Judaicos os Muculmanos.
Dos setembristas não tenho boa memória, tambem já não foi este século, gosto mais do 25 de Novembro, que tambem já não foi este século. Mas este Blog é Multitudo, logo só pode ser abençuado. Portanto melhorar ainda, o que se aguarda!

Anónimo disse...

Pois claro, o anonymous não me falou desse pequeno detalhe no outro dia, havia mais gente. Tipo gente lá da terra pra quem a palavra blog éra há uns meses um codigo secreto. É agora uma tentação, mas no caso particular uma fonte de informação, cujo acesso é fisicamente impossivel, aumenta a espectativa a necessidade de recolher informação, fica-se literalmente á toa, estão a falar daquilo mas não percebo nada... sei do que falam ( julga saber) mas como não tem acesso ( mesmo que tivesse...) fica preocupado, algo lhe passa ao lado como nunca. Não me digam que isto não é estar e poder mudar, ficar e poder continuar, pra mim é um luxo. Admitindo no entanto que alguns excessos de bondade possam sem querer, por mais cedo ou mais tarde essa nossa pseudoindependência em jogo? como tudo na vida os nossos grandes amigos, são muitas vezes os primeiros a dizer sem nos perguntar! Ele tambem é do Benfica, mas ontem disse-me a mim que o Benfica devia perder. Quando o que eu disse foi que o Benfica não jogou nada e portanto não digo que eles tiveram mais sorte do que nós.

Anónimo disse...

era uma vez um gato maltez.
cujo dono lhe calçara umas botas.
o gato não passou do primeiro cão.
caçado e mordido por um rafeiro.
só as patitas estavam feridas.
dia seguinte mordidinho nas patas.
recusou-se a comer, os fiskers.
no entanto as botas estavam novas.
e o gato só pele e osso não saia.
morria-se lá na casota mais botas.

Esta estória pode até quem sabe ser editada, ela não está acabada, se o anonymous fizer a segunda parte, eu faço a terceira e ele a quarta.

Anónimo disse...

Eu sei que somos um pais "piquinino" e agora Républicano, mas tambem já tivemos fundadores desse lado, com o nosso sangue, ou queres que grite!

Anónimo disse...

Se eu tivesse vivido em 1822, tambem era setembrista! Mai nada.
Tinha era acrescentado á carta o direito das mulheres terem acento.

Anónimo disse...

Ganda animal, tambem bebia uma preta. Assim tenho que me contentar com o red do teu grand.
14, qualquer coisa, só podia.

Anónimo disse...

Have a nice trip! And, Dont, forgot, your old uncle!

Anónimo disse...

Maybe you can tell, to your new friends, the forget and the forgot, by Fernando Pessoa in the last book about the subjec.

Anónimo disse...

Gato maltez, primeira parte segunda edição.

passaram os anos e o rato roeu.
a casota ficou com uma saida.
o gato viu o sol e saiu por lá.
pegou nas botas com os dentes.
fez um buraco com as patas.
meteu lá uma bota e fechou o dito.
pegou na outra e meteu-a na saida.
antes voltou a entra na casota.
o dono um dia voltou com novo gato.
abriu a casota e ficou assustado.
o gato escanzelado nao miou fugio.

segue-se a segunda parte?

Anónimo disse...

Os T no meu ingles são pagos.

Anónimo disse...

Gato maltez primeira parte ùltima edição.

gato maltez fica junto ao canil.
uma opção á gato maltez enfim.
afinal tirou as botas, pro cão.
maltez não come ossos nem sopas.
comia comida de gato nunca pensou.
que os cães mordessem botas novas.
afinal foi mordido porque tirou.
o dono é que lhas calçou mas ele.
tirou sem aviso do dono magoavam.
foi mordido, ferido sem saber ler.
o maltez sabe ler, até sabe fugir.
assustou o dono, sabe das botas.
curou as feridas e vai agora.
sempre usar o que deus lhe deu.

Anónimo disse...

O meu amigo Lapaxeiro sem duvidas, mas na verdade e "infelismente", aqui quem utiliza os slogan não denuncia, nem a faxa de gaza, a ùnica abordagem dos verdadeiros cotas aos putos é exatamente slogan da TVI ou do genero, sempre na prespectiva de que tambem estão informados e de que acompanham aquilo de que os putos se "cultivam", o é já a seguir é sinal de conhecimento, dito com jeito pode ser até á centesima vez a piada do dia. Restam meia duzia, mesmo seis, os quais eu admito que vejam os morangos, não, não são os do silva, mas esses não comentam no café o episódio anterior, nós esperamos por eles no blog com açucar. espero que cheguem, só depois lhes vendemos as receitas com picante QB, pra poderem cozinhar comida amiga do ambiente.