terça-feira, agosto 17, 2010

CLVII - A NOSSA FALADURA - TORA

Não se pense que falamos da Bíblia judaica...A TORAH, livro sagrado por excelência para o judaísmo e, sobretudo, os famosos livros do Pentateuco (Penta=cinco e Teka -armazém,arquivo), a saber: Génesis,Êxodo,Levítico, Números e Deuteronómio, os únicos cinco directamente revelados por Deus a Moisés.
Não é dessa Torah que hoje tratamos...
Nesta altura do ano já se descamisava muito milho ratinho nos lastros dos balcões graníticos.A vizinhança , depois da janta, juntava-se e, todos juntos tiravam o folhedo ao milho e punham a nu a maçaroca que depois acabava de secar num panal que era recolhido todas as noites por mor da orvalhada, que na aldeia dos xendros era sempre farta, dada a sua cota baixa.
Não era só o milho que era descamisado. Também as primeiras vagens secas do feijão que havia de durar para todo o anosofria do mesmo afã.
Júlio Dinis descreve exemplarmene esta faina agrícola na Morgadinha dos Canaviais e, se na xendrice não se davam beijos quando surgia uma maçaroca de milho-rei, pelo menos, o bafejado disso fazia alarde.
Local por excelência era o balcão da Tonha Costa, ali mesmo no largo da paragem das camionetas, pois ficava mesmo por debaixo de uma lâmpada de iluminação pública e era largo quanto baste para dez pessoas ali compartilharem trabalho antes da deita. Muitas noites ali estive eu também com um pau aguçado para furar alguma camisa mais húmida e fosse resistente ao desfolhar de cada uma das folhas até chegar à maçaroca.
Falava-s de muita coisa mas não de bola, nem de"gajas" nem doutras futilidades que tais. Assuntos sérios a maior parte das vezes, sem que, de vez em quando não surgisse por ali alguma historieta brejeira, não raro com alguma malandrice inocente pelo meio...
Às vezes aparecia por ali o Tonho Félix, filho de velha Lorpa e que era o único varão xêndrico que acartava a água no cântaro de barro à cabeça, sem o auxílio das mãos e sem molídia. O barro assentava directamente no cocuruto da cabeça de Félix. Quer ele, quer a mãe andavam sempre descalços e lembro-me dos pés da velha Lorpa que eram quase tão largos como compridos,devido ao tamanho descomunal dos joanetes. Pisavam silvas e os carapetos não entravam naqueles cascos (perdoe-se a força da expressão).
Na escala de inteligência de Binet, muito provavelmente Tonho estaria com 55 a 60 pontos de Q.I., o que o situaria no degrau do parvo e é consabido que quando se socializava, de imediato era o alvo das atenções e servia de bobo. O ser humano é mesmo assim: o que importa não é a pessoa,mas o defeito da pessoa e sente um prazer inefável a gozar com a inferioridade do outro: se um indivíduo tem a triste sorte de ser marreca, o mais não interessa, mas é o marreca para todos.
Tonho não era senhor de uma chiba muito acentuada, mas dava para perceber que tinha uma pequena concertina às costas.
Eu não era melhor que os outros e uma noite meteu-se-me na cabeça atentar Tonho Félix:
-O Tonho, de dia está calor como um corno e tu podias ganhar uns trocos se à noite fosses cortar as maçarocas das canas. O milho já está todo desbandeirado e as canas deixava-las lá que depois o Vigura logo as ata e as traz. Nós aqui só precisamos das maçarocas.
- Tu num vês que de noite stá escuro como o alcatrão?
- Eu empresto-te o meu cágado... e arranjo-te uma bucha num bandoleira como tu nunca viste: um pão de quilo, uma cabaça de vinho, uma tora de toucinho februdo, e outra tora de chouriço paio do ano passado e um grande naco de queijo.
- Tu és parvo,pra que queria eu o cágado? (Os outros também parvos a olhar para mim sem verem onde é que isto ia dar).
- Levas um coto duma vela e uma caixa de palitos. Quando já não vires riscas um palito na lixa da caixa apichas a vela, botas uns pingos de cera na casca do cágado, pões o cágado no chão e, como ele anda devagar, tu tinhas tempo de ver a maçaroca na cana, de a esnocar e meter para a saca.
Tonho não ouviu mais nada, sai disparado a rosnar e os outros , vá lá, só depois dele desaparecer, é que comentaram e se desmancharam a rir
- Um raio ta palira, garoto do diabo, és tchapado... Onde é que foste a buscar essa do cágado... um raios ta palira!
O Sr. S. Bartlameu vem aí... A descamisa já não se faz e a festa rija em honra do orago também já foi coisa doutros tempos. Já não há maçarocas e os frangos para o leilão e as belas fogaças já estão em extinção.Nem já para as merendas se levam toras de toucinho februdo ou de morcela ou chouriça,.
Vale o baságueda para rememorar...
Ainda no tempo do Padre Pinto - Que repouse onde merece estar...- fui eu o leiloeiro. Aquilo esteve valente e os mordomos nunca tinham visto tanto dinheiro e disseram ao Padre Pinto
-O Rapa a unha, vai ali para a adega e come e bebe o que quiseres com quem quiseres
Eu fui e agarrei uns poucos. A loja tinha por lá umas abóboras meninas e como os vi meios tocados, enxertei um garrafão do Chquim Bargão e parti uma botelha, pus numa travessa
: Vá lá... comei aqui um melãozito... Dois ainda roeram e apenas disseram que tinha falta de doce...
Outros tempos, outros passatempos.
Se estais de férias que sejam mais doces que as botelhas.
XXXXXXXXXXXXXIIIIIIIIGGGGGGGGGGGRRRRRRRRRRAAAAAAAAAANNNNNNNNDDE

8 comentários:

Zé Morgas disse...

Mainada.
A excelência do Baságueda no seu melhor. A ver se sábado, há por aí na terra dos xendros, umas toras de bom toucinho para acompanhar uns tintos de verdade.
O que também pode dar uma valente tora.
Até lá, Passai bem.

António Serrano disse...

Que melhor sina pode ser a de o professor subscrever as palavras do que foi um excelente Aluno?
Obrigado, Zé, por me teres "tirado as palavras da boca". Que não a tora... Essa eu não a largaria.
Abraço todos.
Bem, hajam!

pratitamem disse...

tENHO, QUE FALAR AQUI, QUE ME PARECE, EXISTIR FAlta de te!

pratitamem disse...

è o zé e tu tó, TAMBÉM gostei da musica! Achco que logo há mái!

pratitamem disse...

Não 2quero. o Basagueda, tipo caixa registeradora, em qualquewr lingua! Eu, não conheco mi estado! Sei que o João Luís já acabou, as Férias, e neste sss, vos digo, que tewnho saudDEW,, DE O LER"!

Manuel Borges disse...

Tão longe no tempo e tão próximo da minha juventude quando tenho oportunidade de ler estas crónicas que retratam tal e qual o quotidiano desse tempo.Obrigado.

ALMADODIABO disse...

Tora de "Tchouriça", um bom Casqueiro e um garrafão de carrascão...eis que nisto acordei e bati com os "ditos" na mesa de cabeceira...vou mas é à deita, passando pela cozinha, calhando, bebo uma minizita e já gozo...Bem Haja

BARUCK disse...

Meu nome é LUCIANO , não sou CIGANO, mas estou a cada dia mais fascinado pela cultura CIGANMA, gostaria de saber como posso fazer para ficar proximo a tudo isto que está mexendo comigo . Uma Reunião uma festa etc.., etc..