domingo, março 26, 2006

A NOSSA FALA - LI - CANCHAL

Hoje apetece-me falar convosco de valores. A afirmação dos valores foi desde sempre questão polémica. Sem grande detenção no assunto inclinemo-nos já para uns contornos bem definidos: os pais tendem naturalmente a pensar que os valores em que gravitam são também o Sol em torno do qual os seus descendentes devem orbitar. Esquecem-se que os valores transitam, que os novos têm outras apetências, que os tempos se alteram, que o mundo oferece opções, situações e problemas que não páram, que as idades são diferentes, enfim, que sei eu?... Veja-se só a título de exemplo que os nossos avós e até os pais de grande parte dos que nos lêem viviam com a prática da poupança. A ordem era gastar o menos possível e amealhar o máximo. Confundiam poupança com economia, diremos nós, mas o que é facto é que essas poupanças permitiram aguentar o país e autorizar o António que morreu, Oliveira que secou, Sal que se derreteu e Azar que acabou (?!) a dizer: orgulhosamente sós. Essa é que é essa !
Nessa altura o país não importa e agora nem se importa.
A malta hoje vive numa ambiência de consumismo desenfreado em que se disputa o mais moderno e passageiro, a marca mais na voga e se deita para o lixo o ainda recuperável.
Já ninguém passaja meias, nem bota remendo em calça, mete palha em enxerga, aproveita resto para vianda de porco, nada, vá!.. Os lixos estão permanentemente atestados de coisas ainda valiosas.
Não há dúvida os valores mudaram.
Em tempos tive conhecimento de um trabalho de campo de investigadores, que perguntavam a crianças entre os 11 e os 13 anos, o que é que elas mais queriam. Invariavelmente as respostas cairam sobre vivendas com piscina, dois ou três carros topo de gama, viagens em volta do mundo, dinheiro com fartura, isto é, tudo o que levasse à boa vida. Nem um considerou o trabalho como um valor, tão pouco a saúde ou a família, mesmo a solidariedade e a paz! Incrível! Mas foi assim mesmo. O mundo virou-se: já nada é como dantes!
NÃO! não sou saudosista do passado. Escrevo com Sophia:"saudades, tenho-as do futuro"!.
Vem tudo isto a propósito de uns valores de que, calhando bem, grande parte de vós nunca ouvistes falar e muito menos tivestes o ensejo de viver ou compartilhar.
Era eu moço, havia algumas rádios piratas, algumas mesmo esporádicas e que emitiam de sítios imprevisíveis e alterados para não serem apanhados nas malhas dos esbirros guardadores da República. Havia sobretudo a Rádio Moscovo e a rádio Argel. Ouviam-se muito mal nos rádios caixote e mesmo nos de FM. Eu ia ouvi-los para o CANCHAL do alto da estrada, ali, paredes meias com o depósito da água a meio caminho para Aldeia de João Pires. O silêncio era religioso. apenas o Nosso Sargento - amigo que há muitos anos não vislumbro - um abraço para ele - tirava fotografias, em pose, à lua... fotos fantásticas, que depois passava a slide e que encantava na sua sucessão. Um espectáculo!
Não era este todavia o CANCHAL mais famoso ali da área. Esse lugar era ocupado pelo canchal da nora, lá para os lados da serra a dar vistas para a Bemposta, por detrás e à esquerda da Carochinha e do João Ratão. Famoso ainda o Canchal da serra Pedreira e, claro, o do Chico Sarapião no batcharel perto da fazenda que o Zé Ferrenho fazia. Um viva a este grande compincha que a gadanha da morte ceifou bem cedo!
De todos, porém, o mais famoso Canchal é o penhasco de MONSANTO, o penico do mundo como lhe chamava o velho Pote, pescador emérito com fémur de platina e sempre de chapéu, mesmo na missa. - Que se sentia encouro sem a cobertura, dizia. O chapéu era para ele um valor! e que valor! Como para mim era escutar os rádios Moscovo e Argel, lá no alto, noite fechada, às escondidas, ouvido colado ao aparelho.
Para o Canchal da Nora, fui eu aos tordos e pombos bravos e o que mais aparecesse, uma noite, mais o Nosso Sargento, o Manel Celestino, o grande, Quinzinho das Águas, os quatro na Zundapp, e noutra mota, Zé Pcanino, o ronquinha, Riconho e Marocas. Tinha eu palmado oito pilhas das grandes da caixa e um punhado de chumbo.
Por volta das 23 , eles aí vão. As viaturas ficam na serra junto ao Barata e o resto do caminho é feito a pé, às escuras.
Marejava um poucachinho, a lua estava tapada pelas núvens, mas o astro ainda assim não era dos piores e a malta aguentava bem o frescor. Era enorme a vantagem desta meteorologia: se pisávamos galho, não se ouvia, se partíamos ramo o pássaro não se mexia, se déssemos com a canela em calhau desalinhado, a dor era abafada pelo musgo que a cobria e servia de amortecedor... Breu como estava, a luz dos Foxes atravessava o éter húmido, o alvo era isolado, o tiro partia, o apanhador arrecadava, tornava-se a carregar, apontava-se a outro e, pronto! era assim. Tudo caladinhamente! Mainada.
Nessa noite vieram para a caçolada 16 pombos bravos, duas rolas, 20 tordos e 56 pardais. Um monte de carne.
Nas voltas e revoltas e até reviravoltas, a gente, sempre a olhar para o ar, perde o tino e logo, a orientação. Foi assim que Riconho, naquela sua inconfudível voz roufenha se sai com esta - estávamos nós já de regresso e tínhamos chegado ao cimo do Canchal donde, ainda que mal, se entreviam as luzes de Penamacor que acompanham a subida desde o actual posto de abastecimento até ao cimo de vila e castelo -: "Ina cum filha da puta! Já chegamos a Castelo Branco! Quando é que agora hamos de chegar às motas! Salta Ronquinha:" Vocêi, Vocêi, está marado, ó quêi? num vê qué a vila, seu babanca!? Nosso sargento, naquela sua calma característica, ria. Eu meti ferro" è Castelo Branco, poi! aquilo ali é a Marechal Carmona (agora Humberto delgado), Riconho tem razão. Temos que caminhar toda a noite para apanharmos as motas. Nosso Mário:«hein,hein! deste volta à cabeça! aquilo é a rua das tílias! e Riconho: «Estamos enganados. Penamacor é para o outro lado! estamos chapados. Se a água começa a cair comédado apanhamos um pneumonia . O melhor é ficarmos aqui debaixo dum barroco acendemos uma ala e esperamos que o sol nasça. » Ataca Celestino: «é, poi! acendes o lume e no tarda nada tens a Guarda Republicana a ver o que se passa. Ficas cá sozinho! Riconho ponderou e atira!: «esperar lá aí um pouco que vou além ao cimo do canchal a ver se vejo a nossa Aldeia. Ele viu luzes, viu, só que, desorientado como estava, apontava teimosamente para a Bemposta e que a Aldeia ' num era para onde nós dizíamos'. Vínhamos caminhando, rindo e mandando calar Riconho e a sua teimosia até que chegamos às motas. Aí, Riconho nem queria crer que estava em casa.
A Rosa estava a fechar e Riconho foi ali envergonhado até aos limites do possível . Ameaçou que ia buscar a caçadeira e que nos vindimava ali mesmo. Valeu a ponderação de Nosso Sargento. Pagou uma rodada e a história só hoje foi ressuscitada!
Outros tempos, outra gente, outra linguagem, outras aventuras, outros amigos, outros valores.
O que vos digo é que se me enagalhou o cachaço de tanto andar a olhar para o ar, que andei 15 dias que mal me podia revirar. Vi-me nas horas del conho para fazer o petisco.
Um dia que calhe dou-vos a receita. XXXXXIIIIIIIIIIIIGGGRRRRRAAAAAAANNNNNNNDDDDEEEEEE!

12 comentários:

CanisLupusSignatus disse...

sublime...

Anónimo disse...

Isso é o quê, Lapaxeiro? Cartão de credito?

Anónimo disse...

Gold? Ou os pequenos vagabundos. Ainda na versão original.

Anónimo disse...

Pode dizer-se òstia, só conheço essa versão, foi a que eu vi.

Anónimo disse...

Nem que a lua, mudasse o norte. Nunca estaria, tão vazia assim. E eu gosto mesmo de mim.

Anónimo disse...

Não havia necessidade, mas, juro epá, não, a sério, é o meu puto. Gosto tanto dele. Tira sempre os oculos, quando nos olhamos.

Anónimo disse...

Mudam-se os tempos, mudam-se os valores.....é certo que os meus valores só o são para mim, é verdade também que os meus valores de ontem já foram ultrapassados, hoje "maiores valores se levantam". No entanto não deixo de me "assustar" com certos valores, não de garotos de 13 anos, mas de pequenos de 4 anos....o conteúdo dos seus desejos é de tal maneira fútil, as suas descobertas são analisadas de uma forma tão vazia! É esta a sociedade que temos, foi isto que fizemos, as crianças seguem modelos, imitam comportamentos. Eu acredito que se os adultos não hierarquizarem os seus valores e continuarem a deixar as crianças seguir este modelo (isento de valores reais) vamos ter uma bela sociedade daqui a uns anitos.... mas os meus pais ensinaram-me que devo sempre respeitar os outros e os seus valores, por isso esta conversa fica só entre nós, foi só um desabafo.

Anónimo disse...

Meu Deus, alguém com valores, foi multado. Não era 31 era 29. Alevanta-se um auto. não.Huáu os putos não aguento, vou fugir, os putos de 4 anos, gozam comigo, vou alistear-me,. na Marinhã. Òpe de Santarem. És ma zé maluca, Já não tenho tempo, isso, era outra vida, nunca entraste, azar. O meu, agora é tarde. Ele há coisas, que eu e outro, tipo, eu dominamos, de forma diferente, mas, mas, com Amor igual.

Anónimo disse...

mUDA DE VIDA. FAZ-TE Á VIDA, PUTO MEU, SERIA UM BASBACE, NO MEIO DESSE GRANEL. Faz-te á vida. Máta-te. Enforca-te, mas deixa de ser implicativa. Deves pensar que és um caso isolado. Abre os olhos, olha pró vitor pró pombo, prá manela, parte a frontaria, mas ou mudas, de profissão ou não. Não é uma profissão qualquer, tem lá calma. Queres o que? Um Oscar de Los Angels. O Henry Ford. Ou já percebeste, que váis, lá parar, oussi, naquele frio, de resposta impossivel. Sem conversa. Ou fazes aquilo, que não sabes, ou mudas de vida. Não passes é vida a brincar com assuntos sérios, porque há quem tenha mais medo desse destino, ou tinha. E o respeito é nenhum. Logo vai brincar exatamente com isso. Sortuda da Silva.

Anónimo disse...

Não se vende lá na farmácia. Não há. azar nem o há grande, uu, pois, parece que tenho, que pedir, a Deus, desde quando. Sim desculpa, se puderes, agora. Essa novidade, de desculpar, a prestações, tem tudo a ver. Com isso esse caminho. Eu não posso é viver isso, a minha vida a prazo. Então dá-lhe. Certo. Isso, onde vai já a desculpa. Jámais, perdoada, como se eu fala-se alguma mentira. Como se eu não tivesse, esse mál no lombo, como se isso me cura-se os meus males. Como se eu não fosse impune. Logo uma grande treta. Que circo, tão lindo, Há gajos que não acreditam, eu sou um deles. ( Diz que não. )

Anónimo disse...

Tentando descortinar este dialogo entre o xendro e o pratitamem, parece evidente o desconhecimento, da matéria. Presumo eu, por conclusão de ambos, ou seja entre o há e o haver. Com a vontade de um e do outro o saber. Como parece que nunca escreveram juntos, nem ao ponto de saber se era bic ou parker, nem sequer ao gosto de sentir a ponti-mola, no caso ambas usam, ao nivel dos topos de gama.
Parece-me, até por falta de mais matéria, ter que dar o caso como inconcluido.

Anónimo disse...

Desculpe lá, isso é o quê? conheço esse dois. È o mesmo. Quer saberr os meus Horra´rios, èpa não curto. Foi a melhor e a pior sena, de toda a minha vida! Mas eu sou, só um velho, sem saudades, dos meus erros, muito menos, da minha falta de retórica, em momentos de loucura, dela. Foram as últimas lágrimas, verdadeiras, ou as primeiras, talvez!