segunda-feira, setembro 21, 2009

VINDIMA OUTONAL 2009



Há mais ou menos 13 luas atrás foi ASSIM


Este ano...
CARDÁPIO/PÓCIO

α Fruto seco, moído, amassado, fermentado, fatiado e cozido em forno abobadal

β Ameixas martinicanas abertas a vapor alhínico, aromatizadas com erva coentral e suco cítrico

γ Traseiro curado de nalgudo beloteiro

δ Bife de caroço

ε Marisco de pantera negra

ζ Interstício moedor de bípede galináceo em molho xêndrico à moda antiga, levemente carilado e especiaria excitante

η Assadura em braseiro vivo de frutos pingentes encarnados e verdes, pelados e temperados

θ Berlindes tomatinos com cristais evaporados ao sol de água ondular

ι Pequenas leguminosas cozidas ao poejal combinado com nadador marítimo conserveiro e bolbo choroso, essência galinácea, acetizado e olivificado

κ Alimento de pobre conservado demolhado cozido e gratinado em barro com imo de poedeira

λ Palavreado roto de Manuel Hipólito

μ Carolada de milho adoçado e comido à mão

ν Achinchada curtida de alimento de mamífero

ξ Fruto de uva a duas cores vinificado

ο Destilado de balsa uveira em aroma de roble seco

π H2O fervente passado por grânulo torrado de grão torrefacto e importado

sexta-feira, setembro 04, 2009

A NOSSA FALADURA - CXL - BANDOLEIRA

O natural é o caos. Já assim era com Hesíodo. Só quando Cronos toma conta do Caos é que a ordem surge: tinha aparecido o tempo e o tempo tem ritmo, ordem, sucessão. Por isso Cartesius lhe chama a ordem das sucessões. Mais ou menos como aprendíamos quando éramos crianças: a história (esse estudo científico que indaga o passado para bem compreender o presente e até prever o futuro), a história é a sucessão sucessiva de sucessos que se sucedem sem cessar...
Por isso se pode falar da eternidade de Deus: como não havia tempo antes de ele ter criado a sua obra, então é eterno. De facto só pode falar de ANTES e DEPOIS quando a obra aparece. E ao primeiro dia Deus disse : faça-se noite e fez-se noite e fez-se dia. Na mitologia grega foi o Érebo que gerou a noite que gerou o dia e por aí fora. Só há tempo e, portanto, ordem, quando algo aparece. Que somos nós senão uma efemeridade temporal? Só contamos no ínfimo intervalo de tempo, enquanto vivemos. O tempo começa para nós quando nascemos -lá está no B.I. - e termina quando nos apagamos - e lá está na certidão de óbito - mas essa data já não a lemos, porque já não estamos no tempo. Durante um ligeiro instante passamos pelo "laser" do tempo e vemos e somos vistos. Antes não éramos e depois já não somos. É sempre assim: quem nasce traz consigo o embrião da morte.
O primeiro vestígio, que eu saiba, deixado pelo homem, em que claramente se pode ver uma tentativa de contar o tempo é uma espécie de cobra de madeira onde constam 28 ranhuras. Exactamente o período de uma órbita lunar. Essa constância levou o homem a registá-la. Daí veio o mês, mas o ano não tinha doze, tinha dez: daí que Setembro fosse o sétimo mês e Dezembro o décimo e não o 12º. A culpa foi dos césares: Caio JÚLIO César e Octávio César AUGUSTO, que se auto imortalizaram incluindo os meses de JULHO e de AGOSTO, o que fez com que nem OUTUbro fosse o oitavo, nem NOVEmbro o nono.
Seria fastidioso que eu agora vos tentasse explicar aqui como o meu avô, o velho Comandante, me ensinou a ler as horas à noite. Mas o erro não é grande e nunca perdia o combóio se me regulasse por esse relógio empírico. Adiante.
Raro teria sido o garoto xendro do meu tempo que não tivesse guardado uns borregotes. A mim também me calhou. Já aqui vos contei que ainda me apalparam as fúcias porque eu não sabia que o borrego acarrava e cheguei a casa antes do tempo - cá está outra vez o tempo -.
Havia na aldeia e nas circunvizinhas rebanhos valentes, tanto de ovelhas como cabradas. Sabia-se o dono pela música dos chocalhos: da casa Megre, da casa Campos, da Casa Franco Frazão, do velho Barroso, do Labouxa, do Stronca Brochas, do Puta Maluca, do Tonho Pedro, do ti Domingos Landeiro, dos Abades, dos Compõe, ..., Conhecia-se ao longe o som o reboleiro e o rebanho estava identificado e localizado. Técnicas de outros tempos em que não havia chips nem GPS. Era outra a ordem da vida como era outra a ordem do tempo. O tempo tinha outro ritmo: nada era virtual. Tudo se limitava ao local e ao presente próximo. Não dava tempo para outras cavalgadas ou ritmos.
Em regra, as grandes casas tinham pastores, ganhões, quinteiros, juntas, vacadas, cavalos,... e um capataz quando das colheitas agrícolas: ceifas, azeitona, malhas, sementeiras,... e um Maioral, o pastor dos pastores.
Era vê-los, Domingo, depois de missa, fato de sarrabeco (=surrobeco), jaqueta ao ombro ,colete justo, camisa bordada, relógio de bolso suspenso de casa de botão por corrente de prata reluzente, sempre polido e certinho, bota cardada, espora brilhante em tacão alto, chapéu de aba larga, castanho de mel, patarras descidas, ....; nem a jogar ao fito ou à raioula tiravam a indumentária. À tardinha lá iam a cavalo ou de macho "ver do vivo que não tem Domingos"
Os maiorais e os capatazes não tinham bandoleira. Os pastores , esses todos tinham. E mais: a bandoleira não tinha compartimentos. Aquilo era uma sala grande onde cabia tudo de tudo: era um caos... Mas tinha uma ordem: a ordem acidental que opastor lhe dava quando metia tudo outra vez na bandoleira. Cabia tudo ... Fosse como fosse.... A ordem variava. Como nós...
O maioral e o capataz comiam no rancho, ali onde ficavam as furdas, os bardos, as cavalariças, as eiras a horta da casa, a adega, as lojas e os celeiros, tudo o que era governo de ano inteiro para a casa, eles não precisavam de bandoleira. Já não era assim com os pastores que andavam por lá, dormiam em choças, bebiam água das fontes com o gado e, por isso andavam sempre limpas, e só vinham às vezes ao fim de semana reabastecer de tabaco, conduto e uma cabaça de vinho. A bandoleira era toda em cabedal, incluindo a cinta que a prendia a tiracolo por detrás das costas. O princípio era sempre o mesmo: a capa e a merenda nunca ficam na fazenda. Era na bandoleira que ia a merenda: pão, e conduto: toucinho, queijo, alguma chouriça, um naco de presunto, e no princípio a perna de algum galo ou ovelha badana cozida no panelão de ferro. Era tudo bom, nunca havia azia e as horas de comer era quando calhava que era preciso guardar bem o gado, mais agora no tempo das vindimas, assistir a partos, tosquiar, ordenhar, mudar o bardo,.... Era a vida.
Não hvia pastor que não fosse hábil a atirar o cajado e nem sempre era para tornar a ovelha tresmalhada ao rebanho: conheciam de cor luras, camas de lebre, ninhos de perdiz, pirolis, codorniz e cotovia, cova de texugo, tudo.
Comi muito coelho que alguns vendiam e traziam invariavelmente na bandoleira, para poder comprar uma onça de tabaco HOLANDEZ e dois livros de mortalha TORO para acigarrarem nas horas mais calmas de solidão.
E pronto. Hoje não vos trago herói. Trago-vos uma caterva deles.
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